Curtia a dor do vazio lentamente, não olhava para ninguém mais, o olhar atirava direto para o horizonte, passava em branco por centenas de comentários de que não podia passar o resto da sua vida pensando no que podia ter sido - podia mas não foi - vivia no ontem e seus dias passavam em rewind, seu futuro era o passado e não queria nada diferente disso. O sorriso era o mesmo, o toque da mão no ombro era o mesmo, o perfume era o mesmo, as roupas eram diferentes mas o olhar ansioso também era o mesmo - olhar que continuava arrancando sorrisos desavisados - mudaram mas continuavam, cada um de um lado, evitando contato. Ela olhando pras paredes, ele olhando através delas, e a única coisa quente eram as cores, no sábado mais frio do ano.
domingo, 15 de agosto de 2010
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
A Sexta-Feira Mais Fria do Ano
Já não queria mais, sentia que nada de bom podia extrair daquilo tudo, os momentos eram diferentes, os envolvidos eram diferentes, as opiniões então nem ousavam se cruzar, conversava mais com o cachorro do que com ela, preferia, já não se encantava pelo seu sorriso, passavam o dia próximos mas a distância era enorme quanto uma conversa em chinês - ela achava mandarim a coisa mais complexa do mundo, ele, achava que era ela - o toque era o mínimo possível, a troca de olhares já se transformara em obrigação há tempos, a conversa era monótona - por isso preferia o cachorro - Dormiam um para cada lado da cama, ela sempre pegava o edredon inteiro deixando ele descoberto, mas era o coração dele que se mantinha gelado na sexta-feira mais fria do ano.
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
A Quinta-Feira Mais Fria do Ano.
Procurava nos outros a felicidade, não contente deixava a melancolia com o toque de seus lábios, era linda - e sabia, e se usava, e deprimia - jogava com corações sinceros, as vezes com pervertidos e daqueles que mais gostava: os metidos a homem pra casar. Odiava homens pra casar - eles eram bons demais com crianças, sabiam cozinhar, inteligentes e acertavam no lugar, horário e presente de natal. Mas ainda assim eram maníacos por futebol aos sábados, colecionavam figurinhas da copa e largavam a toalha em cima da cama - colecionava cartões de reconciliações, tentativas, era linda - e sabia, e se usava, e deprimia - se deprimia quando lembrava do toque dele, que parecia ser a única coisa que iria esquentar na quinta-feira mais fria do ano.
terça-feira, 10 de agosto de 2010
A Quarta-Feira Mais Fria do Ano.
Acompanhava o jogo na TV enquanto tentava mexer o nariz. Maldita mania que tinha "aprendido" com ela - dizia que era bonitinho - viciado passava vergonha em lugares públicos, e o pior é que lembrava dela quando riam escondido da sua cara. A única coisa que gostava nela era o chocolate quente que fazia, chocolate, coisa que parou de tomar no instante em que pós os pés pra fora de casa - pés no momento sem meias e gelados pela quarta-feira mais fria do ano.
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
A Terça-Feira Mais Fria do Ano.
Preferia o silêncio a ouvir novamente a voz de quem o fazia tanto mal. Não era exatamente prazer que sentia ao sofrer, mas buscava constantemente situações que lhe permitiam degustar a compaixão de outros. Se perdia no que não sentia - apesar de que a vontade não faltava - pensava sempre que talvez nunca tivesse e que provavelmente nunca sentiria. Intenso era tudo que colocava pra fora contrapondo tudo que vinha para dentro. O ar era vazio - e frio - no momento só pensava em alcançar mais um cobertor, a única coisa que esquentava na terça-feira mais fria do ano.
domingo, 8 de agosto de 2010
A Segunda-Feira Mais Fria do Ano.
Ela caminha pensativa sobre quem havia se tornado, estava alienada de desejos da alma, o pé enraizado não deixava com que ela fosse levada. Sentia falta do vento no rosto. Contavam-lhe histórias sem pé nem cabeça e muitas coisas que ela gostaria de ter vivido, dançava com a intensidade de criança mas por dentro sentia as pernas cansadas. Chorava ao acordar pela manhã. Não via o copo meio cheio nem meio vazio, simplesmente queria que fosse pro inferno toda ladainha, metade cheia ou vazia! Queria amor de verdade, trabalho que desse tesão, tesão que acabasse na cama de conchinha. Queria cerveja gelada com bolo de chocolate - gosto é gosto, ela particularmente gostava do desgosto - o pé na areia a cada quinze dias e fazer quantas tatuagens tivesse vontade. Tinha vontade de respirar vida, mas a fumaça do malboro light atrapalhava. Tinha vontade de parar de fumar mas o vício era necessário para a pouca convivência social que tinha. Queria preencher mais o espaço dentro dela mesma, se sentia pequena dentro de si. Mas já estava atrasada, passou a mão nos fones brancos de ouvido e saiu com os cabelos ainda molhados do banho da segunda feira mais fria do ano.